GESTOS QUE ETERNIZAM

O VELHINHO E O BOMBOM DIET

 

 

Este mundo é realmente divino; tem coisas tão lindas acontecendo em nossa volta e raramente ficamos sabendo. O dia-a-dia  de nosso povo é dinâmico e não dá tempo de conhecer  seu pensamento, seu  coração e principalmente sua alma.

Entramos no shopping, numa loja de chocolates, e vimos saindo um senhor de idade, aproximadamente oitenta anos, andando com o auxílio de uma bengala, com um sorriso nos lábios.  Pouco se importava com as pessoas que estavam à sua volta.

As atendentes da loja estavam falando a respeito deste simpático “velhinho”:

– Todos os dias ele vem aqui e compra um bombom  diet.

A outra,  cheia de curiosidade,  que deveria ser nova na loja, perguntou:

– Ele come o bombom  e vai embora?

– Não – respondeu uma delas – pede para colocar na embalagem da loja, como se fosse para presente. Depois ele paga, pega o bombom com todo carinho e vai embora.

– Todo dia ele faz isso? – perguntamos para a gerente.

– Todo dia – contou ela, é um ritual.

A nova atendente disse:

– Mas porque ele não compra cinco de uma vez, será que não tem dinheiro?

A gerente da loja nos disse:

– Às vezes tenho vontade de dar este bombom para ele sem cobrar nada, mas fico receosa de que possa ofendê-lo.

Fizemos as nossas compras na loja, para levar para uma pessoa doente e fomos embora.

Mas o mundo é pequeno e alguns dias depois veio um pedido para visitar uma senhora que estava doente e lá fomos nós.

Surpresa total. Quem nos abre a porta é o “velhinho” do bombom diet.

– Obrigado por terem vindo –disse ele, sempre gentil – entrem, minha esposa está no quarto, muito doente, ela tem Alzheimer, não liguem se ela falar a mesma coisa.

Entramos, fizemos a visita para ela, rezamos e percebemos o carinho muito grande do nosso bom “velhinho” para com sua esposa.

Uma das filhas reveza com uma cuidadora de idosos o tratamento dado à esposa do seu José. Este é o nome do nosso velhinho muito simpático.

Mas, antes de sairmos do quarto, seu José saiu e voltou em seguida, então fez o que certamente fazia todos os dias, deu para a esposa o bombom diet na embalagem da loja.

Ela olhou para ele e disse:

– Eu estava com tanta vontade de comer um bombom e eu só posso comer diet por causa da diabetes. Que bom que você lembrou de mim.

Abriu o pacotinho e comeu como se fosse o néctar mais delicioso do mundo.

Entendemos rapidamente que ele fazia isso por ela. Nos emocionamos com a dedicação do amor que através deste gesto diário, queria dizer que se lembrava dela, que a amava. Era o código deles, certamente. A única frase completa e sem erros, falada com toda a ternura,  vinha do ato de  levar o bombom e  agradecer. Um trajeto  de história de amor,  como se fosse o passado acontecendo no presente.

No portão da casa, na hora em estávamos saindo, contamos que o vimos na loja de chocolates. Aliás nós o vimos inúmeras vezes no bairro. Ele então sorriu e nos contou:

– Todos os dias eu vou à loja de chocolates. Bem, não vou somente aos domingos, pois os filhos e os netos costumam aparecer. Quando minha esposa estava bem, antes de ficar doente, eu passava todo dia e levava um bombom para ela. Algumas vezes, também uma flor.  Ela ficava muito feliz.

– Que beleza, é uma história de muitos capítulos.

– Sim, porém com o tempo ela piorou muito.

De fato, a esposa estava na cama, sem muitos movimentos e com pouca lucidez.

– Mas algo mágico – acrescentou –  quando entrego o bombom ela parece voltar ao seu mundo de sempre.

– Nos olhamos emocionados. Ele acrescentou: Apenas agora, o bombom é diet.

E disse ainda: "Só por estes momentos vale a pena ir todo dia lá".

A verdade é uma só, coisas do coração não se explica, a gente sente e pronto. O amor tem seus mistérios na gentileza da alma.

 

 

 

 

Pe. Antônio S. Bogaz (orionita), doutor em Filosofia, Liturgia e Sacramentos e

Teologia Sistemática – Cristologia

Prof. João H. Hansen, doutor em Literatura Portuguesa e

Ciência da Religião e Pós-doutor em antropologia